segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

A Psicologia hoje: formação, ciência e profissão

A Psicologia não existiu sempre. Nasceu na sociedade moderna, fruto do desenvolvimento da individualidade. Ela não foi um conhecimento sempre existente ou necessário. Surgiu com o desenvolvimento do capitalismo; surgiu com o desenvolvimento do individuo e com o sentimento do “eu” que o acompanhou. A noção de “eu” e a individualização vão nascendo e se desenvolvendo com a história do capitalismo. A necessidade de uma ciência que estude este sentimento e este fenômeno também é resultado deste processo histórico. A Psicologia foi se tornando necessária.
Hoje, nossa sociedade se apresenta vagarosamente individualista. A Psicologia é uma ciência que responde a necessidade de darmos conta deste “eu”, de sua relação com o mundo, de sua dinâmica, de seus sofrimentos. A Psicologia se desenvolveu como ciência conforme a vida social foi exigindo este tipo de saber e fazer. É nesse processo histórico que ela vai também se diversificando e criando novas áreas de saber.
A tradição da Psicologia, no Brasil, foi marcada pelo compromisso com os interesses das elites e tem se constituído como um mundo pronto, hierarquizado de forma idêntica a hierarquia que dominava o universo. A hierarquia social precisava ser derrubada fazendo crer a todos que a mobilidade social era uma realidade social. O mundo estava posto em movimento e ao homem estava colocada a possibilidade de ser, pensar, fazer e escolher. A vida do trabalho vai saindo da ciência e uma profissão para o controle, a categorização e a diferenciação.
As guerras trouxeram o desenvolvimento dos testes psicológicos, instrumentos estes que viabilizaram esta prática diferenciadora e categorizadora da Psicologia. E foi com este lugar social que a Psicologia se institucionalizou no Brasil, sendo reconhecida em 1962 como profissão.
Desta foram, a Psicologia só poderia se constituir enquanto prática profissional como um conhecimento e um conjunto técnico que detecta desvios do desenvolvimento humano (em relação ao que é concebido como natural), propondo-se como algo que se reencaminha, realinha, adapta, cura. A Psicologia se associa a idéia de doença. Chegamos a reivindicar o direito de medicar. Mas nosso objeto de trabalho não é o corpo que adoece. Nosso objeto é o mundo simbólico. Nosso objeto é o registro que os sujeitos fazem do mundo que os cerca, do cotidiano. Esse mundo se estrutura, se desestrutura, sofre, mas não fica doente, no sentido de adquirir mal, moléstia ou enfermidade.
Os problemas básicos da formação que vimos acumulando em nossos debates são: uma forma tecnicista; há na maioria dos nossos cursos, pouca ênfase a pesquisa e a Psicologia como ciência; não incentiva a prática do “questionamento”, da dúvida a partir da observação da realidade; nossa formação tem distanciado a Psicologia da realidade social; o resultado é que prepara os profissionais para uma sociedade ideal; não se ensina a Psicologia como ciência histórica; não se ensina a perspectiva interdisciplinar; pouco se tem ousado nas práticas de estágio.
A Psicologia em sua história, ainda não se inseriu na sociedade brasileira de modo a estar acessível a todos que dela precisam. Os compromissos sempre foram com as elites. O trabalho, os instrumentos, os saberes estão ainda referenciados nas camadas médias e altas da população, quando temos a maior parte da nossa população nas camadas baixas. Produzimos saberes que buscam atender as camadas pobres da população, mas ainda não são saberes e fazeres dominantes.
Nossa profissão ainda não está amplamente acessível à população. Eis nosso desafio: colocar a Psicologia a serviço de quem dela precise. Defenderemos essa meta para a Psicologia como forma de compromisso social: construir uma profissão que esteja acessível a quem dela precise. Não podemos manter nossa profissão como uma profissão de elite e para a elite.
É possível pensar em tornar nossa profissão acessível para a população, desde que nossos governos invistam em políticas sociais, de saúde e educação, abrindo espaço de trabalho para o contingente de nossa categoria e colocando dessa forma nosso conhecimento e nossa profissão ao alcance da população pobre. Para isto, é preciso que os psicólogos se entendam como cidadãos que no espaço da polis, disputam projetos sociais e se organizam para lutar, para reivindicar, para construir um futuro para a Psicologia que seja de uma profissão útil, a serviço de quem dela precisa.

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