sexta-feira, 15 de junho de 2012

Escritos do Filme "Garota Interrompida"

 Susanna toma muita Vodka com aspirina. Na “viagem” dela, imagina que suas mãos estão sem ossos. Ela foi parar em uma clínica psiquiátrica, foi diagnosticada como vítima de "Transtorno de Borderline" - uma aflição com sintomas tão ambíguos que qualquer garota adolescente pode ser enquadrada. Enviada para um hospital psiquiátrico, onde viveu nos dois anos seguintes, ela conhece um novo mundo, de jovens garotas sedutoras e transtornadas.
Entre elas está Lisa, uma charmosa sociopata, Daisy e Polly, que planejam fugir com o intuito de retomarem suas vidas.
Porém, não era como as outras pacientes, vivia mais próxima da sanidade, se é que se pode dizer que eram insanos, o filme confunde muito razão e loucura. Susanna foi diagnosticada com Síndrome de Borderline ou vítima de "Ordem Incerta de Personalidade", um sintoma comum em qualquer garota adolescente.
É uma paciente suicida que chega a seus momentos limítrofes, e que agora tenta achar um novo sentido à vida. Elas aprontam na clínica, se divertem, e são boas às estórias dos personagens, os motivos de eles estarem ali. Faz refletir sobre realidade e insanidade.
Os estudos do Borderline têm uma grande função na psicologia, abrangendo também o campo da psiquiatria, pois se pode dizer que esta doença apresenta um dos piores prognósticos, tornando, assim, seu tratamento bastante difícil e complicado. Este transtorno também é considerado uma das doenças mentais de mais difícil solução. Isto é explicado pelo fato de que esta doença tem seu início na infância ou na adolescência e assim é assimilada pela personalidade ainda em formação como uma de suas características. Desta maneira, este transtorno torna-se um grande desafio para os profissionais da área.
O transtorno Borderline de personalidade foi definido e difundido na América Latina por Donald Meltzer com pacientes que estavam em transição, notadamente da neurose para a psiconeurose. Mas, atualmente um dos maiores estudiosos desta patologia é o vienense Otto F. Kernberg, que considera o transtorno Borderline de personalidade um dos maiores problemas de campo da psiquiatria e da psicologia.

A Organização Borderline de Personalidade á Luz da Psicanálise

Os valiosos e profundos estudos sobre a organização borderline de personalidade foram concluídos por Otto Kernberg. Segundo este estudioso há três características dominantes relativas a este transtorno:

1. Grau de integração da identidade.
2. Tipos de operações defensivas que ele habitualmente emprega.
3. Capacidade de testar a realidade.

Em relação à primeira característica, no Borderline há uma desintegração da identidade. Em relação à segunda característica, há uma predominância de operações defensivas primitivas centrada no mecanismo de cisão. Na terceira característica é mantido o teste de realidade.
Estas três características são consideradas dominantes, pois constituem a base de toda a desorganização da personalidade Borderline e são estas que vão diferenciar o Borderline dos pacientes neuróticos e psicóticos, por isso elas são bastante importantes para o diagnóstico.
Na sua relação com o mundo, o fato mais marcante, que exprime uma de suas características internas, é o fato dele não saber exatamente o que sente pelas pessoas e por si mesmo. Ele não sabe quando os outros são bons ou maus, apresentando uma oscilação entre extremos: num momento sente que é mau e os outros são bons e em outro momento ele se sente como bom e os outros maus. Este fato descreve sua oscilação entre a culpa e a perseguição, que são os dois sentimentos mais presentes na vida do Borderline. No primeiro momento, ele se sente culpado. Já no segundo momento se sente perseguido e esta passagem de um extremo para o outro se dá muito rápido. Este comportamento mostra uma característica interna onde o ego do sujeito não consegue discriminar representações de self ligadas a afetos amorosos de representações de self ligadas a aspectos agressivos; da mesma forma em relação às representações de objetos. Assim as representações de objeto, são sempre equivocas, transformando-se, às vezes, em segundos de idealizadamente boas às persecutórias, demonstrando a inconstância dos objetos internos, os quais são ameaçadores e a qualquer momento podem trair, derrubar, abandonar e destruir.
Vivendo, então, em perigo constante dentro de si mesmo, o Borderline fica extremamente ansioso e agressivo. Outra consequência deste perigo interno é o excessivo apego e dependência dos objetos externos, sobre tudo das figuras mais próximas e necessárias. Quanto mais ele fica dependente desses objetos externos que em um determinado momento são sentidos como maus e logo depois como bons, mais o ego do Borderline se enfraquece, carregando um alto grau de ansiedade. Mas, apesar disso, ele precisa se apegar a esses objetos externos, pois diminuem a culpa, na medida em que o Borderline percebe que, apesar dos seus ataques esses objetos ainda estão vivos e imunes à maldade do self.
Os mecanismos de defesa primitivos protegem o ego de conflitos por meio de dissociação ou do afastamento de experiências contraditórias do self e de outros significativos, ou seja, esses mecanismos separam estados contraditórios do ego. Contanto que essas contradições possam ser mantidas separadas, a ansiedade que advém desses conflitos é prevenida ou controlada. Mas, apesar de diminuir a ansiedade, esses mecanismos quando ativados enfraquecem o ego, promovendo uma falta de integração entre os objetos internos e externos.
Enfim, a organização Borderline de personalidade vive num mundo escuro, de pesadelo, cheio de "fantasmas" ora perseguindo-o ora culpando-o. Como eles não apresentam uma divisão segura e firme que separa o pré-consciente do inconsciente e não conseguindo utilizar o mecanismo de repressão (alivia mais a angústia), vivem uma dor permanente da qual ele não pode escapar. Somente através de uma terapia psicanalítica este quadro poderá ser revertido.
"Pode-se dizer que o tratamento da organização Borderline de personalidade consistiria economicamente numa transformação das pulsões: de morte em vida, destrutivas em amorosas sadomasoquistas, em auto conservadoras".
A personalidade borderline é um grave transtorno mental com um padrão característico de instabilidade na regulação do afeto, no controle de impulsos, nos relacionamentos interpessoais e na imagem de si mesmo. Apesar de não ser tão divulgada quanto outros transtornos psiquiátricos, sendo que a maior parte das pessoas afetadas corresponde a mulheres.
Identificar uma pessoa com personalidade borderline não é difícil, pois os sintomas incomodam todos os que se relacionam com ela, especialmente familiares. O quadro engloba algumas manifestações típicas de vários transtornos psiquiátricos como esquizofrenia, depressão, transtorno bipolar, mas em geral os pacientes não saíram totalmente do estado considerado normal para serem enquadrados em tais classificações. A “síndrome” borderline é, portanto um mosaico de sintomas menos acentuados de diversos transtornos. Para assegurar um diagnóstico preciso foram estabelecidos nove critérios no DSM IV (quarta versão do manual de diagnóstico e estatística de doenças mentais). Nele, a personalidade borderline aparece classificada dentro do grupo dos transtornos de personalidades emocionalmente instáveis.
Outra característica marcante pintada para este quadro é a de impulsividade, manifestada de duas formas: há pacientes deliberadamente autodestrutivos, que apresentam comportamento suicida, podendo apresentar automutilação, ameaças e tentativas de suicídio; outros pacientes manifestam formas mais gerais de impulsividade, caracterizadas, pelo abuso de drogas, desordens alimentares, participação em orgias, explosões verbais e direção imprudente.
Por último, os pacientes apresentam relacionamentos intensos e instáveis, cujos problemas mais comuns são o profundo medo de abandono, que tende a se manifestar em esforços desesperados para evitar ser deixado sozinho, e alternância entre extremos de idealização e desvalorização, sendo os relacionamentos marcados por frequentes discussões, rompimentos, baseados em uma série de estratégias mal adaptadas que irritam e assustam outras pessoas.
Várias causas são apontadas para a origem do transtorno. Acredita-se que, além do forte componente genético, experiências traumáticas na infância, como abuso sexual e negligência, causariam a desregulação emocional e a impulsividade, levando aos comportamentos não funcionais, déficits e conflitos psicossociais.
O impacto social desse transtorno é muito grande, a taxa de mortalidade devida ao suicídio é alta. Trata-se, desta forma, de uma das desordens psiquiátrica comumente associada ao suicídio. Os tratamentos usuais são pouco efetivos, já que mesmo recebendo medicamentos e tratamento psicossocial, os pacientes continuam com graves desajustes no trabalho, nas relações sociais, na satisfação global e no funcionamento geral. Assim, para controlar esses pacientes, os melhores resultados têm sido obtidos com programas de psicoterapia, podendo ser citado o relevante papel da terapia cognitiva comportamental – a terapia dialética comportamental. No entanto, esta abordagem requer uma assistência continuada, uma vez que este tipo de patologia envolve graves transtornos de personalidade, o que fragiliza o ego possibilitando recaídas marcadas pelo comportamento imprevisível.
Os pacientes que aderem a esse tipo de tratamento chegam a diferentes níveis de gravidade e para cada nível é identificado um alvo inicial de tratamento. Em pacientes com descontrole comportamental severo, a prioridade é melhorar a regulação do comportamento, isto é, colocar o paciente funcional e produtivo. Já para os suicidas, naturalmente, o primeiro passo é reduzir o impulso suicida. Quando já se conseguiu o controle do comportamento, a disforia e as dificuldades de lidar com as experiências emocionais tornam-se o foco da terapia.
Como o transtorno afeta as relações interpessoais, muitos preconceitos e muita incompreensão acompanham os pacientes com personalidade borderline. Muitas vezes, tais pessoas são rotuladas de “irresponsáveis”, “egoístas”, “desequilibradas”, “problemáticas”, o que só agrava sua instabilidade e faz com elas se aproximem mais e mais da loucura, já que dificilmente sozinhas conseguirão contornar a dificuldade. Para conviver com a personalidade borderline, o primeiro passo é caracterizá-la como um transtorno psiquiátrico tratável e procurar ajuda com profissionais da saúde especializados. Tanto a atitude pessoal de aderir à terapia, quanto à educação da família são essenciais, na medida em que o único tratamento efetivo é o de equipe, contando com a colaboração de médicos, psicólogos, a família e o paciente.

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